Texto escrito para a revista Caminhando com o Itepa! Mas no final tem um bônus possível somente aqui ;-)
Refletir acerca da então denominada Geração
Y nos direciona inevitavelmente a alguns questionamentos que, ao
tempo que servem de norteadores do desenvolvimento deste texto,
trazem desdobramentos importantes para a compreensão da dinâmica
social contemporânea e, consequentemente, para nossa ação no e
para o mundo. Dentre estas questões levantadas destaco: Quem
faz parte desta Geração? Existe alguma relação com o momento
histórico em que estão inseridos? Esta classificação tem a ver
com o quê exatamente? Que características destes sujeitos os
credenciam a uma denominação própria? Qual o potencial desta
geração, ou das características que trazem, para a transformação
social?
Minha tendência natural seria dar ao texto um
teor mais acadêmico-científico, lançando mão para isto de
citações bibliográficas, rígidas regras metodológicas impressas
em mim por décadas de experiências acadêmicas vivenciadas desde os
primeiros anos de escola e exercitada compulsoriamente até hoje em
minha função universitária. Entretanto, fui acometido de um outro
questionamento: Que motivo me impede de escrever sobre a Geração Y
a partir de suas próprias características? Por isto, este texto
está organizado da forma mais flexível e informal aceitável para
uma revista de grande circulação e com uma tradição de levantar
com seriedade questões pertinentes do mundo contemporâneo como é o
caso da Caminhando com o Itepa.
Neste sentido, e me perdoem os acadêmicos em
tempo integral, meu único objetivo é estabelecer um processo de
comunicação e de inquietação em cada pessoa que tiver contato com
estas ideias a partir do estabelecimento de raciocínios que partem
dos seguintes princípios: 1º. É fundamental que se criem
motivos de agregação em torno do tema; 2º. Todas as
informações, ideias, conceitos, reflexões realizadas, opiniões
apresentadas, não são de minha autoria, mas de um sem fim de
pessoas, vozes, perspectivas, experiências e leituras que conheci,
escutei, vivenciei e fiz durante todos e cada segundo de minha vida;
3. Tudo o que quero é compartilhar algumas concepções
nascidas desta vivência para, quem sabe, estabelecer parcerias para
a discussão e, se possível, auxiliar ao menos uma pessoa na
compreensão do mundo e assim, no seu poder de transforma-lo.
Mais ainda, quero instigar o debate acerca dos
elementos circundantes e periféricos ao tema central deste texto, a
então denominada Geração Y [nota de rodapé: Não
acho adequada a identificação da geração por uma letra do
alfabeto. Quado ele acabar vamos lançar mão dos recursos das
planilhas de cálculos? Geração AA, Geração AB, e assim por
diante? Penso ser mais adequado atribuir a esta geração algo que
remeta a características marcantes do momento histórico em que
vivemos, sem dúvida, a conexão. Assim, denominarei esta Geração
de Geração Conectada.], fato pelo qual o disponibilizei em meu blog
para debatermos e aí sim expandi-lo, agregando a ele ainda mais
pessoas, vozes, perspectivas e leituras, em uma autêntica opção
baseada na forma de ser e estar no mundo daqueles que
fazem parte deste grupo e que deverá servir de material de pesquisa
para meu próximo livro [nota de rodapé: Para dar sua
opinião e iniciarmos nosso diálogo basta acessar
http://goo.gl/C9hGI]
Pois bem, feitas estas primeiras e provisórias
decisões, quero retomar um a um os questionamentos que destaquei no
início deste texto como norteadoras das questões sobre as quais me
proponho a refletir.
A primeira busca identificar quem faz parte
desta Geração? É indiscutível que esta denominação é atribuída
aos indivíduos que possuem grande familiaridade com os computadores,
que tem na internet seu primeiro recurso de pesquisa e que a utilizam
para realizar tudo aquilo que for possível. Nos dias de hoje,
praticamente tudo. Existe também uma corrente que busca classificar
de forma rígida os indivíduos em função de seu ano de nascimento,
o que tem certa lógica uma vez que todos somos profundamente
influenciados pelo momento social do qual fazemos parte. Assim, se
nascemos em uma sociedade informatizada a tendência é que tenhamos
maior naturalidade e facilidade em dominar tais tecnologias. Qual a
fraqueza deste último argumento? A sociedade é informatizada mas
nem todas as pessoas tem acesso aos aparatos tecnológicos
disponíveis.
Considero que do ponto de vista de
desenvolvimento tecnológico mundial, a Internet foi, sem dúvida
alguma, um divisor de águas uma vez que muda radicalmente a forma
como nos comunicamos, como construímos coletivos inteligentes e
amplia sobremaneira nossas possibilidades de ação no mundo. Nesta
perspectiva temos aqueles que a conheceram em diferentes momentos de
suas vidas e aqueles que nasceram em um mundo já conectado pela rede
mundial de computadores. Os primeiros tendem a apresentar certo
estranhamento na relação com a tecnologia, o que não é uma regra
uma vez que conheço inúmeras pessoas com mais de 40 anos que se
apropriaram de forma muito profunda e criativa das tecnologias
contemporâneas, mais um motivo para não vincular idade ao domínio
das tecnologias. Por outro lado, já presenciei inúmeras situações
em que pessoas com menos de 15 anos desconheciam completamente a
internet.
Claro que cabe uma ressalva: Os contemporâneos
da web possuem uma enorme facilidade em apropriar-se dela e de suas
possibilidades. Fato para o qual tenho uma teoria construída a
partir da interação com muitas outras pessoas, das quais destaco
Fritjof Capra: a internet possui a mesma dinâmica da mente e da
organização social humana. Assim, todos aqueles que, como eu, foram
moldados a pensar linearmente como em um texto, quando tem de fazer o
retorno a essência da cognição humana – que tem uma dimensão
reticular assim como a internet - tem dificuldade em compreender sua
lógica hipertextual, baseada em uma rede tridimensional de
possibilidades e que autoriza a qualquer um assumir o papel de
protagonista, de autor, de emissor de sentidos, significados e
informações. Por outro lado, aqueles que sofreram menor influência
daquilo que Paulo Freire chamava de educação bancária,
caracterizada pela verticalidade, hierarquia e linearidade, possuem
menos desconstruções e a fazer. Assim, e isto não é regra, quanto
mais jovem maior a probabilidade de pertencer à Geração
Conectada.
A esta altura da leitura, já é possível
perceber que adentro naquilo que penso ser uma resposta ao segundo
questionamento: Existe relação entre esta geração conectada e o
momento histórico em que estão inseridos? Manuel Castells,
sociólogo catalão aponta que as tecnologias centrais de um
determinado momento social, em nosso caso a internet, são
determinantes para a compreensão do mundo e para o desenvolvimento
humano. André Lemos, teórico brasileiro da comunicação vai na
mesma linha ao mencionar que as tecnologias não somente influenciam,
mas definem as transformações sociais. Pois bem, mas quais seriam
as características básicas deste momento histórico? É claro que
existem inúmeras situações que são únicas da atualidade, mas
dentro da extensão e do objetivo deste texto, me parece que duas
merecem destaque: A conexão e a democratização das possibilidades
de comunicação.
O nível de conexão mundial estabelecida pelas
redes de computadores cresce de forma exponencial. Para se ter uma
ideia deste crescimento, de 2000 a 2011 o número de internautas de
língua portuguesa aumentou 990,1%. Outro elemento importante a ser
destacado é que embora a conexão seja suportada por uma estrutura
técnica de computadores, tablets e celulares, quem está de fato se
conectando são as pessoas com suas diferentes inteligências, visões
de mundo e experiências. Estamos conectados 24 horas por dia, 7 dias
por semana e os desdobramentos disto podemos, e devemos, discutir no
blog! Por agora quero lembrar que quanto mais heterogêneo um grupo
maior a possibilidade de suportarem processos complexos e ricos de
interação e crescimento. A valorização e o respeito às
diferenças é fundamental em um mundo conetado.
Tal situação de conexão e a hibridização
tecnológica [nota de rodapé: Utilizo
o termo hibridização tecnológica neste texto no sentido de
identificar aparelhos que trazem em si inúmeras possibilidades de
utilização, como os smartphones e tablets, por exemplo. Em 2012 o
Brasil já conta com mais de um aparelho aparelho por habitantes] , estabelece uma situação propícia para que
as pessoas se comuniquem mais, troquem informações, conectem o
mundo a partir de blogs, sites de disponibilização de fotos,
ambientes de disponibilização de vídeos, espaços de
webconferências onde podemos ver e conversar com pessoas localizadas
em qualquer lugar do planeta de forma instantânea.
Milton Santos, geógrafo brasileiro já
alertava para o fato de que as tecnologias contemporâneas nos
habilitam a estar qualquer lugar do mundo a partir de qualquer lugar
onde estejamos. Na mesma linha, Pierre Lévy aponta a forma como esta
potencialização da comunicação suportada pela conexão
possibilita que percebamos o mundo todo sem sair do local onde
estejamos e nele possamos nos projetar.
Tal situação de conexão e de democratização
da comunicação ajuda a entender os motivos pelos quais a cada 24
horas são disponibilizadas 864.000 horas de vídeos no youtube por
exemplo, que é apenas um dos milhares de sites de disponibilização
de vídeos existentes na internet. Também é responsável por
mobilizações sociais como a primavera árabe que dentre outros
acontecimentos provocou a queda
Muammar Abu Minyar al-Gaddafi da Líbia e a renúncia de Hosni
Mubarak no Egito, bem como serviu de espaço de organização
do Movimiento 15-M realizado
em 2011 na Espanha, dentre tantos outros exemplos em que as redes
sociais foram espaços legítimos de mobilização civil [nota de rodapé: A
este ponto você já deve ter se perguntado inúmeras vezes: “Será
que eu sou da Geração Conectada?”. Uma dica: se você pensou em
recorrer ao Google para saber mais sobre estes acontecimento existe
uma grande chance de fazer parte deste grupo!].
A esta altura
já podemos tratar das próximas questões: Esta classificação tem
a ver com o quê exatamente? Que características destes sujeitos os
credenciam a uma denominação própria? Fazer parte desta geração
conectada tem pouco a ver com o ano em que nascemos, mas com a forma
como nos apropriamos destas tecnologias, com as habilidades que
desenvolvemos nesta relação e, principalmente, com o rompimento com
antigos padrões que já não dão mais respostas às demandas e
possibilidades do mundo contemporâneo.
Mas afinal,
quais seriam, em linha gerais, as principais características desta
geração? É movida pela curiosidade e reconhece na Internet um
campo aberto para satisfazê-la; Possui um grande potencial de
criação de comunidades a partir de seus próprios interesses e
demandas; Trabalha na lógica da cooperação e do compartilhamento
onde o que importa é ajudar o próximo mesmo sem conhecê-lo e
compartilhar sua visão de mundo através da troca de uma música, de
um livro, de um game, um post em um Blog, a alteração do status no
Facebook ou qualquer outra forma digital de representação da
informação; Busca o desenvolvimento de habilidades e competências
técnicas que ampliam seu pode de ação; Tem uma capacidade singular
de realizar várias coisas ao mesmo tempo podendo modular sua atenção
para determinada tarefa quando isto for necessário; Prioriza o
processo ao produto, a forma ao conteúdo, a criatividade ao
conhecimento; Apresenta dificuldade de se adaptar a tudo que é
baseado na linearidade, na hierarquia e na verticalidade como a
Escola e a Universidade por exemplo [nota de rodapé: Espero
sinceramente que este parágrafo abra uma profícua discussão que
subsidie a ampliação de cada um destes pontos.].
Por fim, o que
podemos aprender com esta geração? Num breve exercício de
futurologia, partindo do princípio que nos próximos 10 a 15 anos
não teremos nenhum avanço tecnológico da magnitude, capilaridade e
do potencial de transformação da Internet, podemos explorar
brevemente e o potencial desta geração, e de sua concepção de
mundo, para a transformação social. Assim, vou elencar três que
julgo muito importantes.
A primeira
questão refere-se ao reconhecimento e à apropriação do potencial
comunicacional e autoral das redes. O ser humano só se consolida
como tal na relação com os outros e a partir de suas manifestações
comunicacionais. A Internet é por excelência um espaço aberto para
manifestação e agregação dos indivíduos, assim, não deve ser
utilizada na perspectiva do consumo, mas da geração de informações,
diálogos e conhecimento.
A segunda,
extremamente importante, é reconhecer que não se aprende somente
nas instituições socais criadas especificamente para isto como a
Escola e a Universidade. Vale ressaltar que é fácil argumentar
acerca da fragilidade do que e
de como se
aprende nestes espaços, afinal de contas em um mundo extremamente
dinâmico, em que as demandas ao cidadão não são mais locais, mas
sim globais, não é possível antecipar quais os conhecimento serão
necessários para cada em dois ou três anos. Ainda, na era da
colaboração e do compartilhamento, a lógica do falar ditar do
professor fica extremamente fragilizada quando reconhecemos que sobre
tudo é possível encontrar informações na Internet com maior
profundidade, amplitude e criatividade [nota de rodapé: Uso
a internet como exemplo em função do foco do texto, mas também
poderia ter mencionado livros, revistas, televisão, cinema, jornais,
etc como mecanismos mais eficientes de transmissão de informações.].
E a terceira
de uma lista que poderia ser muito mais ampla, aponta para o
reconhecimento de que a criatividade e a imaginação é muito mais
importante do que o conhecimento adquirido. Ou seja, a capacidade de
adaptação à diferentes demandas e contextos; de relacionamento de
informações advindas de diferentes fontes; e de estabelecimento de
contatos em função de diferentes desafios a serem vencidos em
qualquer âmbito da vida é determinante para o cidadão
contemporâneo inserido em um contexto onde a informação está
virtualmente disponível a todos.
Pois bem,
dentro dos limites deste texto trouxe vários pontos que desejo
sinceramente ampliar a partir das interações que podemos
estabelecer na rede. É importante que se reconheça que optei por
ignorar questões acerca do acesso limitado que uma grande proporção
da população brasileira tem à estas tecnologias; da utilização
baseada em tecnologias de distribuição em massa de informações
como é o caso do livro, do rádio e da televisão, que não são
melhores nem piores que a internet, mas radicalmente diferentes; da
potencialização de situações de crescimento e desenvolvimento,
mas também de degradação do ser humano e da sociedade que também
está presente na Internet, mas que não deve de forma alguma servir
de pretexto para análises preconceituosas, aligeiradas e
descontextualizadas; dentre outras questões.
O fato é que
nosso poder de ação e de transformação do mundo passa pela
compreensão e do domínio das ferramentas disponíveis para ser,
estar,
agir e
interagir neste
contexto reconhecendo seu enorme potencial para processos de
interação humana, de criação de cultura, de exercício da
cidadania e de mobilização. Abaixo alguns daqueles com que
dialoguei para construir minhas percepções de mundo e os
raciocínios apresentados neste texto fixo e rígido no papel, mas
extremamente dinâmico e em constante transformação na rede, como
deve ser!
Autores citados no texto
CAPRA,
Fritjof. As conexões ocultas: ciência para uma vida sustentável.
São Paulo: Cultrix, 2002.
CASTELLS,
Manuel. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
698 p.
FREIRE.
Paulo. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1997.
LÉVY,
Pierre. O que é o virtual?. São Paulo: 34, 1996. 157 p.
SANTOS,
Milton. A
natureza do espaço:
técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo, Editora de
Universidade de São Paulo, 2002.
Favor ignorar a propaganda final! ;-)
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